Comércio eletrônico, delivery por aplicativos, PIX, meios de pagamento online, crédito em fintechs. Se 2020 foi um ano marcado pela tecnologia, o empreendedorismo que soube se adaptar e se digitalizar minimizou os estragos econômicos trazidos pela pandemia do coronavírus.Para 2021, o caminho não tem volta, com ou sem pandemia. A oportunidade é a de aprender a empreender de um novo jeito, no caso de negócios mais tradicionais, e de seguir apostando alto no comércio eletrônico e no marketing digital no caso de quem já iniciou essa trilha.
Confira abaixo o que mais estará em alta no próximo ano, segundo especialistas entrevistados pelo Estadão PME.
O próximo passo da digitalização
O professor de empreendedorismo e inovação do Insper Marcelo Nakagawa acredita que a digitalização continua sendo a palavra de ordem para os empreendedores. “Assim como agora, ganham mais as empresas digitalizadas que aprenderam a usar redes sociais e plataformas de acesso ao cliente, como Dolado (para pequenos lojistas) ou iFood.”
Para fugir das comissões cobradas pelos aplicativos, o especialista ressalta que será importante criar uma estratégia digital de relacionamento direto com os clientes. “Isso vai demandar a criação de bases de informações do cliente e sites transacionais (com pedidos e pagamentos direto no site). Na parte de conquista de novos clientes, empreendedores precisarão aprender mais sobre estratégias de marketing digital, especialmente inbound marketing, em que o cliente é atraído não por uma propaganda, mas por um conteúdo útil.”
O especialista ainda diz que é obrigatório ter presença no Google, especialmente no Google Maps, com informações sobre a empresa: formas de contatos, fotos e interação com os clientes que postam comentários. Além disso, ele destaca a tendência dos meios de pagamento digital, impulsionados agora pelo PIX.
Apoio aos tradicionais
“Não só de empreendedores por oportunidade e startups nós vamos viver nos próximos anos. A pandemia causou um grande desacerto na nossa economia e muitas pessoas perderam os empregos”, diz Alessandra Andrade, coordenadora do hub de inovação da Faap, o B.Hub.
De acordo com ela, “ensinar a empreender” será um dos principais pontos de 2021, com um apelo maior para o empreendedor tradicional, que cada vez mais “vai precisar de apoio”.
A professora também ressalta a importância de associações, entidades e organizações de classe para o ecossistema. “Quando somos retirados da situação normal, buscamos representantes. É importante ter acesso e participar das decisões governamentais. Ter proximidade com entidades de classe é importante para desenvolver o empreendedorismo em qualquer lugar.”
E as startups?
Professor da FGV EAESP, Gilberto Sarfati acredita que o ambiente de digitalização generalizada deve contribuir para o investimento em startups. “Terminamos o ano com os IPOs da Méliuz e do Enjoei, sintoma de que o ano de 2021 deve trazer muitas outras empresas de tecnologia para a B3 (Bolsa de Valores)”, diz.
Marcelo Nakagawa aposta que a novidade em 2021 será a esperada aprovação do Marco Legal das Startups. “Ele vai ajudar uma parcela pequena, mas significativa, de negócios inovadores. Esses negócios terão mais acesso a investidores-anjo em troca de futura participação societária no negócio.”
O Marco Legal das Startups, diz, também deverá facilitar a relação entre startups e entidades governamentais. “Irá criar condições para que as startups fechem mais contratos com governos, algo praticamente impossível até agora.”
Outro ponto de destaque para 2021 é o sistema Inova Simples. Por meio da Portaria INPI/PR nº 365, de 13 de novembro de 2020, o INPI regulamentou o procedimento de comunicação de Empresas Simples de Inovação (startups) ao INPI, para registro de marcas e patentes. “O Inova Simples promete facilitar a abertura, a alteração e o fechamento de negócios”, acredita Nakagawa.
Comércio eletrônico
De acordo com o Ebit Nielsen, as vendas do e-commerce no próximo ano devem crescer 26%, atingindo um faturamento de R$ 110 bilhões. A entidade acredita que o desempenho será impulsionado pelo crescimento do número de consumidores, pela consolidação de e-commerces locais, pelo fortalecimento dos marketplaces e pela maturidade logística do setor.
Ainda haverá um aumento de 16% no número de pedidos (passando para 225 milhões) e expansão de 9% no valor médio de vendas (R$ 490). Destaque para as categorias: alimentos e bebidas, arte e antiguidade, bebês e cia, casa e decoração e construção. Os segmentos já apresentaram aumento em 2020.
O suporte do franchising
Segundo a Associação Brasileira de Franchising (ABF), o mercado de franquias trilha um caminho de recuperação gradual, puxado pelos segmentos de casa e construção.
“Esperamos também que alimentação, moda e serviços educacionais voltem a operar no azul, alavancando todo o setor. De forma semelhante, esperamos uma recuperação mais robusta de hotelaria e turismo e entretenimento e lazer, os segmentos mais atingidos até aqui, mas que têm grande demanda reprimida”, diz André Friedheim, presidente da ABF.
Segundo ele, devem prevalecer no franchising a omnicanalidade (com múltiplos canais de atendimento ao cliente, do delivery à retirada nas lojas) e a flexibilidade (para mudanças rápidas, como foi durante 2020).
Já as microfranquias se consolidarão, acredita a ABF, como uma alternativa de ocupação e geração de renda. “Esperamos receber novos empreendedores, especialmente em serviços digitais e modelos home office”, conta Friedheim.
Hubs de inovação e coworkings
Para Alessandra Andrade, da Faap, como muitos empreendedores descontinuaram pequenos escritórios para reduzir gastos na pandemia, os espaços de coworking devem ganhar relevância para abrigar esses donos de negócios.
Ela ressalta que o ambiente colaborativo dos espaços também fortalece a jornada dos negócios que o habitam. “Se por um lado o empreendedorismo e a busca por capital são muito competitivos, esse ecossistema é muito colaborativo”, diz ela, para quem os ambientes de coworking devem ser um facilitador.
Impacto social
“O tema dos negócios de impacto ganhou uma lente de aumento em 2020, à medida que as desigualdades sociais foram ainda mais escancaradas e agravadas”, analisa Maure Pessanha, cofundadora da Artemísia.
Um dos pontos de destaque, segundo ela, são as soluções financeiras para a população em situação de vulnerabilidade social e econômica. “Quando pensamos nos desafios delas para acessar o auxílio emergencial do governo, enxergamos a importância do desenvolvimento de soluções financeiras que pensem nas pessoas de maneira digna, ética e inclusiva.”
De forma pragmática, Maure entende que é importante fortalecer o empreendedorismo de impacto social. “É crucial criar mecanismos de apoio para empreendedores que decidiram agir, mesmo quando todas as probabilidades se mostram contrárias.”
Crédito e microcrédito
Nesta semana, a Câmara aprovou o projeto que prevê a liberação de uma terceira rodada de recursos – mais R$ 10 bilhões – para o Pronampe no próximo ano. A proposta agora vai para sanção presidencial.
Para o professor de Finanças do Insper Ricardo Rocha, é importante o empreendedor entender para que precisa do crédito: se é para capital de giro ou para trocar equipamento, por exemplo.
O presidente nacional do Sebrae, Carlos Melles, acredita que os bancos geralmente fazem muita propaganda, mas emprestam pouco. “Temos as maquininhas, formalizamos o MEI, criamos o PIX, mas não formalizamos o acesso ao crédito. A retomada passa pela micro e pequena empresa, e a retomada delas passa pelo crédito.”
MEI
Se 2020 foi considerado o ano dos MEIs, com o Brasil alcançando a marca de 10 milhões de microempreendedores individuais em abril, a expectativa para o próximo ano é de que o número siga crescendo.
“A necessidade tem feito e continuará fazendo esse número crescer, muito mais do que vocação ou vontade. A pessoa não tem muita alternativa e, legalizando-se, ela passa a ter acesso à Previdência, pode tirar uma nota fiscal. Ela se garante dentro da formalidade”, conta o presidente do Sebrae.
Empreendedorismo na periferia
O efeito da pandemia teve características diferentes para os negócios das periferias. A falta de formalização, as dificuldades com o meio digital e de logística e a informalidade jurídica dificultaram ainda mais a vida dos empreendedores.
Para Luis Coelho, fundador da Empreende Aí, que capacita futuros empreendedores, o fim do auxílio emergencial evidenciará o rombo na economia. “Nas periferias, quando as pessoas ficam desempregadas, elas começam a empreender com coisas simples, fazendo bolos, serviços de cabeleireiro. Isso aumenta a concorrência e pressiona os preços para baixo. Vamos ter menos dinheiro circulando e mais concorrência”, explica.
A dica de Coelho é manter o controle financeiro com rigidez e continuar trabalhando nas fontes de receita criadas na pandemia. “Em 2020, muita gente criou máscaras e conseguiu vender em grande quantidade. É bom se perguntar qual vai ser a ‘máscara’ de 2021. Vão ser os encontros presenciais? Como o empreendedor vai poder juntar gente? As pessoas vão querer sair de casa quando puderem.”
Fonte: Diário do Sudoeste